Suicídio e sentido da vida: investigação fenomenológica

Abstract

Objetivamos investigar, por meio de pesquisa qualitativa ancorada nos pressupostos da Fenomenologia Clássica, como a pessoa, no encontro com o psicólogo-entrevistador, elabora sua experiência de tentativa de suicídio e, eventualmente, articula tal elaboração à questão do sentido da vida. Do ponto de vista teórico, apresentamos diferentes compreensões presentes na psicologia sobre o suicídio, propomos a Fenomenologia Clássica e a Logoterapia como referenciais teóricos, aprofundando nas contribuições de ambas sobre o tema e, por fim, problematizamos possíveis impactos do encontro intersubjetivo na maneira como a pessoa com intenção suicida vive e elabora sua experiência. Do ponto de vista empírico, realizamos entrevista fenomenológica com quatro usuários de um Centro de Atenção Psicossocial que tentaram suicídio há, no máximo, três anos, de modo a facilitar com que o sujeito descreva e elabore a própria experiência. Realizamos análise fenomenológica das entrevistas segundo as diretrizes propostas por van der Leeuw. Na análise compreensiva dos depoimentos, evidenciamos o impacto do encontro na maneira como a pessoa elabora e se posiciona diante das experiências vividas. O encontro foi vivido como acontecimento que permitiu aos entrevistados revisitar momentos difíceis vividos em sua história de vida em um contexto de acolhimento e cuidado gerando movimentos pessoais. Quando analisamos a tentativa de suicídio a partir da história de vida apresentada por cada entrevistado, compreendemos que este ato não pode ser tomado de forma isolada. Nas entrevistas, a tentativa de suicídio apareceu enquanto ação relacionada a uma possível saída para uma situação geradora de sofrimento, mas se trata de um processo dotado de complexidade que aconteceu em um determinado contexto social, cultural e histórico. Apreendemos também impactos das relações no modo como os entrevistados compreendiam a si mesmos, o mundo e a própria tentativa de suicídio. Tais relações, nas elaborações dos entrevistados, dependendo da configuração, emergiram como fator de negação da pessoa ou como potente fonte de sentido e fator de afirmação da vida. Diante disso, concluímos que a descoberta de um sentido para a vida pode impactar positivamente na maneira como a pessoa vive e elabora suas experiências. Também identificamos a potência do encontro intersubjetivo na medida em que pode ser vivido como ocasião que permita a pessoa em sofrimento realizar movimentos que a aproximem de si mesma e fortaleçam seu elo com a vida podendo afastá-la, assim, do ato suicida.